Iº ENCONTRO DAS COLECTIVIDADES CACILHENSES
Intervenção do senhor Fernando Barão
Representante de “O Farol- Associação de Cidadania de Cacilhas”
CULTURA E O ASSOCIATIVISMO
Um homem sem cultura não tem possibilidades de ser um homem livre. Um homem sem cultura é como uma coisa que flutua à tona de água deixando-se arrastar facilmente pela alternância das ideias alheias que, se forem mal intencionadas, o levam por caminhos que desaguam em “becos” com consequências nefastas. Será por isso que nunca chega a criar a personalidade para saber reflectir e amadurecer pensamentos para discernir, com convicção, qual será no futuro a melhor directriz a trilhar.
O academismo poderá ser uma alavanca de alguma elegância cultural mas isso não será o suficiente para quem pretende dar exemplos de uma conduta social tendo na mira a solidariedade entre as populações. E a solidariedade é uma trave mestra na cultura.
Conhecemos homens, relativamente cultos em sabedoria escolar que nunca puderam espelhar condutas louváveis. É que nunca andaram cá por baixo a conhecer dificuldades dos outros. Em contrapartida, conhecemos outras pessoas de índice autodidacta, que conseguiram alcançar uma armazenagem cultural plena de convicções notáveis, e que sempre estão na primeira fila dos acontecimentos com uma militância deveras dinâmica. E estes, embora hajam excepções, vêm geralmente de famílias pobres, remediadas ou pequeno-burguesas. Pois fazem parte da legião laboradora e gatinharam a olhar para os lados, onde existiam e existem necessidades básicas que as sociedades de consumo nunca se acostumaram a remediar.
Perguntar-se-à: - E onde é que estes indivíduos assimilaram os arcaboiços sócio-culturais se as suas cadernetas escolares foram muito pouco preenchidas e os atributos académicos não passaram de uma atitude pouco mais que medíocre …
Começa portanto, aqui, o papel educador das colectividades de cultura, recreio e desporto escalpelizando-se as diferenças entre instituições válidas e instituições nefastas.
Além disso, convém mencionar que, nas instituições, poderá haver várias facetas que reflectirão os benefícios oferecidos a quem as aceita:
1 – Temos as que se dedicam à educação dos seus associados, estabelecendo regras com programas progressivos que nada têm a ver com o que se aprende nas teses do ensino estatal.
Há exemplos notáveis, nesse sentido, no concelho de Almada antes da revolução de 25 de Abril de 1974. Lembremo-nos das Escolas do Desportivo da Cova da Piedade que, funcionando com autonomia administrativa, concederam a centenas de jovens (e não só) uma personalidade educacional, digna dos maiores encómios.
2 – Há também as associações que possuem em si uma liberalidade de processos onde se destacam as manifestações em grupo, através de conferências, de exposições artísticas de vários matizes e também dos próprios associados; de excursões a locais de interesse histórico-culturais; a projecções de grupos para a arte teatral e para o estudo da arte cinematográfica (projecção vilipendiada) com a criação do cine-clubismo, tudo isto complementado com peculiares bibliotecas onde as obras, ao dispor de cada um, se poderão filiar na absorção de uma literatura adequada aos factores das artes, do tecnicismo científico, da moral educadora; e, porque não, às disciplinas desportivas mais conducentes ao tal corpo são numa mente sã.
Todavia, num Seminário sobre vários horizontes culturais, oriundos das colectividades populares, há que denunciar as diversas moléculas nocivas que alienam o desporto e arrastam quantidades magnas de massas de desportistas de bancada, onde a filosofia ganhadora suplanta tudo o que se possa imaginar. Em tudo isto entrará, na equação desportiva, o fatal meio economicista que, de uma forma geral, abastarda a lisura de processos, onde os próprios agentes da dinâmica competitiva servem-se de todos os truques para ludibriar os adversários, os juízes, os treinadores, os dirigentes e até os próprios colegas de equipa. O vil metal aqui, funciona como uma alavanca destruidora dos sãos princípios que levam tudo na enxurrada das conveniências de cada patamar.
Entretanto há que não subestimar os conluios, os subterfúgios e a indignidade de alguns dirigentes que, sendo da mesma estatura do atleta pernicioso e do seu agente empregador, não actuam em disciplina interna, pois o corolário destas diatribes encaminham-se sempre no mesmo sentido em que o cifrão, agora substituído pelo euro, entra sempre na função destruidora da dignidade colectiva. E tudo isto desliza numa velocidade meteórica, como pedra de gelo, que desaba pela montanha abaixo. Depois, entrando-se em paradigmas lisonjeiros, com o que se passa no desporto amador, verifica-se com desgosto, que este tem a pretensão de esquecer os atributos louváveis, para enveredar, quanto mais depressa melhor, na selva dos branqueamentos, das corrupções, nas dívidas monstruosas, nos sacos azuis, numa complexidade malévola a todos os títulos.
É claro que o futebol, como disciplina que atrai as grandes massas populares, é o grande eixo propiciador às atitudes irreflectidas e à alienação da fraternidade, que deveria existir, como guardiã da grandeza do processo límpido e transparente. Mas as pessoas adoram tudo o que é grandioso e chamativo para o engrossamento das más atitudes. – Afirmarei antes, que são levadas com facilidade … É evidente que este mal-estar não se dá só no futebol mas também nas chamadas modalidades nacionais, conforme os países que as cultivam. E é muito difícil lutar contra estes sistemas benevolamente observados pelas entidades públicas, sempre desejosas que haja um esquecimento colectivo para os problemas essenciais e que afectam as multidões, que também incluem alguns prosélitos um tanto ou quanto vítimas (ou profissionais) da irracionalidade que alimenta os vendavais anti-sociais …
E quando, mau grado a conjuntura nacional, se consegue que alguma entidade policial (isenta) comece a puxar uma linha do amaldiçoado “tricot” e antes que o tecido se desfie completamente, logo saltam a terreno os dignos tribunos da cimeira administrativa, a fazer parar o dissabor que já vai atraindo a larga legião jornalística e atiram desculpas apressadas e desconjuntadas, que são análogas a colunas de fumo que transformam as falcatruas em nebulosas propiciadoras às confusões. E quando se vive no reino da confusão …
Depois, há que acenar às entidades judiciais para demorarem processos incompletos, que façam entrar tudo na zona adormecida que leva ao esquecimento. E o grupo dos “Amigos da Tramóia” continua impante na importância do sorriso tão do agrado das multidões distraídas, que andam muito preocupadas com a próxima competição que poderá adjudicar mais um campeonato às suas cores sagradas … E a côrte dos refinados continua a desfilar sendo impossível afirmar que o rei vai nu porque estamos em plena república das bananas e a democracia está com vendas e algemas.
Voltando às primeiras expressões só um homem culto poderá saber pesar todas estas questões que estão avassalando as sociedades de cultura medíocre e destruindo ideologias puras e transparentes.
Será este panorama, quase estereotipado, que não tem lutadores para o enfrentamento no futuro? Tudo isso depende de nós que ainda vamos tendo força para nos reunir e discutir, aquilo que é visível, mas que muita gente não quer ver.
É claro que com uma sede pequena sem condições profiláticas, só com uma mesa onde cabem oito mãos, um baralho de cartas e quatro copos de vinho tinto, não iremos elevar os nossos ideais que se esbatem no infinito. Não, teremos que lutar por um associativismo que ensine, que eduque, que abra olhos e ouvidos, até que, os da bisca lambida, possam compreender as nossas regras de progressismo. Acabe-se com maniqueísmos e levemos a mensagem a toda a gente, por todo o mundo. Continuidades atávicas, nunca mais. Acabe-se com o anquilosamento das sociedades com mentores perversos. Demos-lhes um chuto no cu e, nem que levemos alguns séculos, lutemos por novos caminhos, por horizontes com estrelas ou sóis radiosos. E embora estas imagens onde só falta a pomba branca para proclamarmos a teoria benfazeja da PAZ não se iludam. Isso só para mais tarde. É que eu também sei escrever coisas bonitas.
Mas por agora não … Por agora estamos em tempo de guerra …
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