23 de janeiro de 2007

E assim ganha o mar

As populações de Cacilhas e da Costa de Caparica sempre tiveram, desde que existem registos e memórias, uma relação fraterna e amigável.

Desde o século XIX era em Cacilhas que algumas famílias da Costa vinham viver alguns meses por ano, para fugir aos rigores do Inverno, pois nesses tempos o mar entrava vila dentro.

No Verão, lá seguiam as excursões para ir à praia, e almoçar nas matas, hábito que se começou a generalizar na década de 1950, quando se começaram a fazer percursos especiais de camionetas da carreira, nos meses de Verão e aos fins de semana, quando o tempo estava de feição.

As pessoas esperavam horas nas filas, que davam a volta ao Cais de Cacilhas, até apanhar a camioneta, para irem depois, calmamente pela “estrada velha”, com muitas curvas, atravessando o Pragal, o Monte, as Casas Velhas e a Vila Nova, até chegar ao alto dos Capuchos, e avistar “o paraíso” que se estendia por quilómetros de areia limpa e verde água cristalina.

A “malta de Cacilhas”, por prazer, a que se juntava a falta de fundos para a passagem, arrancava muitas vezes, ao domingo, às 5 da manhã, estrada fora, rumo à Praia do Sol.

Abalavam em alegre excursão pedestre, com a marmita e a toalha às costas, indo à “chincha” pelo caminho. O regresso é que era pior, pois se não havia massa para a camioneta, lá regressavam, aos grupos pela estrada, já cansados dum dia de folia, queimados do sol, dos banhos, do jogo de ”bola do ring”, do “jogo do mata”, e até das ferozes competições do “jogo da perna”. Muitos namoricos e casamento se fizeram nesses passeios.

A praia da Costa de Caparica sempre foi para as nossas gentes, um local de lazer, onde todos puderam ter tempos de alegria e saudável divertimento. Por isso essa terra faz parte do imaginário e da vivência de muitas gerações de almadenses e cacilhenses, que não podem assistir impávidos à destruição deste património do nosso Povo.

Quando na década de 1950, começaram a tirar areia, junto ao Bugio e Cova do Vapor, ao que parece para encher algumas praias da linha do Estoril, destruíram o equilíbrio ecológico então existente.

Assistimos, nos anos seguintes, à progressiva destruição do areal da Costa, que levou muitas casas de veraneantes e pescadores a irem, literalmente, “por água abaixo”.

Até ao 25 de Abril, nada foi feito para repor a normalidade que tinha existido. E a opinião geral era que tal se devia aos interesses da Costa do Estoril… porque não queriam a concorrência da “banda de cá”.

Todavia, passados 32 anos de Democracia, também nada foi feito. Pelo contrário, até se verificou, nos últimos anos, um estranho agudizar da situação.

Em 1995, verificava-se que a língua de areia entre a Cova do Vapor e o Bugio estava em fase de adiantada recomposição. A Natureza, lentamente, repunha o que alguns homens tinham alterado.

É tempo, agora, de o Estado português intervir para preservar este vasto e rico património natural. É altura de todos os almadenses e todos os portugueses dizerem: Basta! Ao António Neves, Presidente da Junta de Freguesia da Costa de Caparica, a nossa solidariedade neste combate que trava em defesa da sua/nossa Costa de Caparica.

Texto: H. M. e Fotografias: José Lérias.

12 comentários:

Anónimo disse...

Também estive lá e fotografei o bar na véspera da derrocada.Ouvi da boca do sr.Presidente da Junta da Costa da Caparica que o sr. Ministro se estava nas tintas para investir dinheiro para esta tragédia ecológica, ouvi coisas que brada aos céus.
Leo

Minda disse...

Pois é Leo. Apesar da aparente indiferença com que os governantes sempre cuidaram da nossa costa atlântica (e não apenas no caso da Caparica), onde os autarcas também têm a sua quota parte de culpa (mais a nível municipal do que de freguesia dadas as atribuições específicas que na área do planemaento cabem às Câmaras e não às Juntas) - e, mais uma vez, não estou a referir-me, especificamente, ao caso da Caparica -, não podemos ter como certas as afirmações que, em momentos críticos se fazem.
Agora que está a acontecer esta "desgraça", é muito fácil sacudir responsabilidades para cima dos outros (porque, afinal, o problema não é de hoje, nem de há três ou seis anos atrás... vem de um flagrante autismo de que sofrem autarcas e governantes desde há várias décadas atrás)...

O Farol disse...

Leo e Minda: independentemente do apuramento de responsabilidades, neste momento o que é importante é a "reparação" dos estragos e, sobretudo, a realização das obras que possam, de modo eficaz e forma eficiente, impedir o rompimento do cordão dunar.
E que este exemplo sirva para alertar as consciências de todos: autarcas e governantes para a necessidade de investirem em medidas concretas de planeamento para esta zona crítica do país (a sua orla costeira) - incluindo a fiscalização das ocupações clandestinas - mas, também, os cidadãos em geral para evitar que construam edificações mais ou menos perenes sobre as dunas, na ânsia de fazer negócio ou ter uma "casa de férias" frente ao mar, contribuindo assim para a sua destruição.

Anónimo disse...

Acho injusto o que estao a dizer sobre os investimentos na Costa da Caparica... Posso afirmar, porque sei, que desde 2003 já se gastaram:
- em 2 meses - 117.000 Euros
- em 1,5 meses - 265.700 Euros
- na actualidade ainda não estao contabilizados os custos, mas a avaliar pelo que têm feito nos últimos dias, calculo quanto vai custar a cada um de nós, a luta inglória contra a natureza, que, do meu ponto de vista devia ser respeitada!

O Farol disse...

Anónimo. A sério ou a brincar, os números que indica são uma gota de água na imensidão do oceano... sim, aquele mesmo que está a arrasar as praias da nossa Costa da Caparica.
E para a próxima pode identificar-se que, por aqui, todos são bem-vindos, desde que o respeito seja o cumprimento de saudação utilizado.

Anónimo disse...

Caros amigos,

Nasci em Cacilhas mas foi na Costa de Caparica que aprendi a nadar.

Mas uma coisa aprendi, mesmo em miúdo quando brincava nos, então, extensos areais das praias da Costa:

- Quando se colocam areias soltas à frente das ondas o mar facilmente as leva consigo.

Esta simples constatação de há já tantos anos, ainda tão criança, leva-me a pensar que os engenheiros que actualmente procedem à reparação e protecção do cordão dunar fortemente ameaçado pelo avanço das águas nunca brincaram, enquanto crianças, na areia da praia.

Ou estarão a dar os primeiros passos dessas brincadeiras agora?

O assunto é sério demais para se andar a fazer brincadeiras na areia.

É tempo de se investir a sério na recuperação e conservação de um património natural que é de todos!

O Farol disse...

Caro Oidotsuc: também a nós, que nada sabemos de engenharia, nem tão pouco geólogos somos, nos intriga a forma como o INAG está a tratar da questão... Mas apenas nos cabe estar alerta.
Porque a nossa função, enquanto cidadãos, é essa mesma.

Anónimo disse...

Acho que seria interessante que quem tivesse fotos antigas das praias da Costa da Caparica as disponibilizasse neste blog para todos vermos a evolução.

ENGº. Viriato disse...

Querem lá ver que a culpa é minha? Fui eu que tirei as areias do Bugio?! Fui eu que me marimbei e autorizei a construção de bares na praia quando já se conhecia este risco?! Fui eu que passei anos a gerir este assunto na pura lógica da agenda eleitoral do partido?! Não está na altura destes senhores todos ganharem vergonha e deixarem pessoas capazes pegarem nos destinos do país e salvarem a nossa terra??!!! Teremos de suportar a partidocracia sufocante até quando? E os técnicos, filhos dos politicos, beneficiários da sagrada cunha, incapazes por formação, vamos suportá-los até quando, a esses fidalgos? E os bons, filho de ninguém, vamos continuar a permitir que emigrem porque cá não têm hipótese? Desculpem lá o desabafo mas a minha capacidade de sofrer pela minha terra atingiu o limite...

O Farol disse...

Caro anónimo, seja bem-vindo.
A sua sugestão é bem interessante. Vamos ver o que é possível fazer. Se o conseguirmos (apesar de Cacilhas ser a terra sobre a qual estamos a fazer a recolha de imagens para completar o Arquivo Histórico da Freguesia) pode crer que aqui as divulgaremos.
Ao fim e ao cabo sempre houve uma "ligação afectiva" entre Cacilhas e a Costa da Caparica, logo ela também faz parte da memória cacilhense.
E num próximo contacto, deixe o seu nome, ou pseudónimo - como entender - apenas para que não tenhamos de o tratar por anónimo.

O Farol disse...

Amigo Viriato (esperamos que não se aborreça por este tratamento amigável).
Percebemos o seu desabafo. Aliás ele expressa a revolta de muitos de nós perante a inoperância (por insassatez politiqueira, falta de profissionalismo ou simples ignorância - e esta, infelizmente, grassa por essas autarquais fora) dos responsáveis, sejam eles autarcas ou governantes.
Mas o comum cidadão, que prefere fingir que não vê, que se acomoda só para não se chatear, que se demite, enfim, dos seus deveres de cidadania, também tem a sua quota parte de responsabilidade ao preferir calar do que manifestar-se - já dizia o povo "quem cala consente" (e, ao fim e ao cabo, somos nós que colocam no poder este ou aquele partido).
Volte mais vezes. Desabafe e deixe aqui as suas preocupações, pois é a partir desta reflexão plural que podemos vir a encontrar as soluções para muitos dos probelmas com que nos deparamos no nosso quotidiano.

Anónimo disse...

Vejam as fotos do avanço do mar entre 1995 e 2005 em:
http://blog-and-roll.blogspot.com/2006/07/so-joo-da-caparica-e-cova-do-vapor-em.html

E' impressionante...